Arborização
Pelotas tem déficit de 87,5% em áreas verdes, aponta relatório
São 215 espaços espalhados pela cidade, mas que não atingem os 32 metros quadrados por habitante recomendados pela OMS
Foto: Jô Folha - DP - O Jardim Suzu, na República do Líbano, é um ótimo local para corridas em caminhadas
Por definição do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), uma área verde, além de desempenhar a função ecológica, paisagística e recreativa, deve proporcionar a melhoria da qualidade estética da cidade. Mas se levar em conta a opinião de quem frequenta, em Pelotas, esses espaços podem representar bem mais. O quintal da casa, a sala de estar no forte do verão, o quarto do pensamento, o ambiente de meditação, e tudo isso ao ar livre na companhia do som dos pássaros e do barulho das árvores embaladas pelo vento. É por isso que a cidade que apresenta um déficit de 87,5% de área verde, pelos padrões da Organização Mundial da Saúde (OMS), precisa ter um olhar mais atento, não só o Poder Público, mas os próprios frequentadores, sendo que muitos fazem desses ambientes uma extensão do lar.
Em Pelotas, que está bem aquém das cidades mais arborizadas do Estado, conta com 215 áreas verdes (dados do Geo Pelotas), sendo que entre elas, 90 são praças e 120 oferecem brinquedos recreativos para as crianças e espaço de lazer para a população. Nesse universo, a reportagem visitou algumas para ver as condições que elas se apresentam. O que se percebeu foram locais habitáveis, brinquedos em condições de uso, muitas árvores frutíferas plantadas e cuidadas, na maioria, pois em algumas delas o lixo e a depredação ofuscam o belo paisagismo e, em outras, o capinzal alto tira o brilho do lugar.
Em meio a este belo cenário, Pelotas tem apenas quatro metros quadrados de área verde por habitante, segundo apontou o Relatório Anual de Qualidade Ambiental, sendo que a OMS aponta como ideal 32 metros quadrados. De acordo com o coordenador do Centro de Estudos Ambientais (CEA), o ambientalista Antônio Soler, a defasagem é grande (87,5%) e está atribuída à ausência de áreas verdes, parques e arborização urbana. "Embora existam mais de 200 espaços registrados, nem todos estão implementados, uma vez que quando surge um loteamento público ou privado, é obrigatório a destinação de área verde, o que muitas vezes não se concretiza, pois quem fiscaliza é quem licencia o local e, portanto, muitos não cumprem", explicou. Atualmente até rótulas são consideradas áreas verdes. "De 25 espaços públicos adotados, 12 são rótulas e dez são canteiros de poucos metros quadrados, estratégicos para propaganda", criticou. O ambientalista atribui o fato à falta de diálogo entre Poder Público e órgãos especializados.
O titular da Secretaria de Qualidade Ambiental, Eduardo Schaefer, entretanto, diz não ter tido acesso a qualquer estudo ou levantamento com embasamento científico recente que tenha feito esta estimativa. "Nunca tivemos qualquer indexação assim, de um estudo científico, que corrobore essas informações". Ele adianta que está em fase inicial um projeto idealizado pela SQA e elaborado em conjunto com o Observatório de Pelotas, de construção de um inventário de áreas verdes. "O objetivo é compilar os dados referentes à situação desses espaços e praças, além de um diagnóstico de como está a gestão deles. A previsão é que o trabalho seja concluído no segundo semestre deste ano", diz.
Outra iniciativa que busca a participação popular no cuidado e preservação desses ambientes naturais é o Projeto Ciclo Verde, de julho de 2021. Desde que surgiu já foram adotadas 28 áreas verdes, dentre elas estão: canteiros, rótulas, praças, orla da praia do Laranjal e equipamentos urbanos. "Até o momento, mesmo com a possibilidade de adoção por pessoas físicas, formalmente nenhum morador manifestou interesse em adotar uma área verde e apenas empresas privadas têm participado do projeto", relatou o secretário. Um dos exemplos, conforme Schaefer, é a praça do Quadrado, adotada pela empresa Sagres no fim do ano passado.
Emendas das impositivas
Do total de 90 praças, sete delas devem ganhar incremento ainda este ano, sendo que seis foram eleitas pelos vereadores para serem contempladas com emendas impositivas, com destinação de R$ 730 mil. As praças contempladas são a Meneghetti, Alberto Rubino, Josimar Rosado, Sanga Funda, professor Luiz Moraes Soares, Santa Cecília e a Vasco Pires. O presidente da Câmara de Vereadores, César Brisolara (PSB), explicou que a licitação ocorreu depois de duas ou três tentativas e que foram enviadas todas juntas, o que dificultou o processo licitatório. "Mas agora está em andamento." O secretário de Planejamento e Gestão, Roberto Ramalho, confirma a informação e garante que a licitação para as intervenções necessárias estão em andamento, algumas já estão em curso, o que descarta o risco de se perder a verba.
Cenário
Praça 1 da Cohab Gotuzzo (Fragata)
Um quarteirão inteiro de grama verde, muitas árvores que garantem sombra o ano inteiro e apenas dois ornamentos em concreto. Assim é descrita a praça 1 da Cohab Gotuzzo pela estudante Cristhine Colvara Portantiolo, 17. A família já trocou muitos domingos de sol quente no verão para ficar no frescor do espaço que costuma ser cuidado pelos moradores da quadra, pois segundo a estudante, a Prefeitura raramente corta a grama. O espaço verde acolhedor, no entanto, só pode ser aproveitado durante o dia, pois não há iluminação no local. Mesmo assim, a cada virada de ano, a praça serve de palco para a celebração do Ano-Novo da família Portantiolo.
Micro parque Arvoredo - Bom Jesus (Areal)
Seis meses depois de ser inaugurado, o micro parque, elaborado todo no conceito Urban95 segue em boas condições, mas já está sem alguns elementos originais. As placas indicativas, por exemplo, estão enferrujadas. O depósito de livros - e os livros - não existem mais. A caixa estava quebrada no chão. Já o chafariz e os bebedouros foram desativados. O espaço segue limpo, e com as árvores plantadas na época semeando. Em contrapartida, do outro lado da rua Mário Peiruque, o cenário é desalentador pelo acúmulo de resíduos e um sofá.
Caixa D'água do Brilhante (Centro)
Em plena área central da cidade, o espaço verde que acolhe uma das mais antigas caixas d'água de Pelotas, na rua Pinto Martins com Andrade Neves, apresenta aspecto de abandono. Grama alta, sem varrição, raízes das árvores à mostra, banco quebrado, mas ainda sim, serve de abrigo para moradores de rua.
Praça Jardim Suzu - República do Líbano (Três Vendas)
São mais de 1,2 quilômetro de muito espaço verde em uma área privilegiada na Zona Norte de Pelotas. A praça da República do Líbano, o Jardim Suzu, tem espaços bem cuidados e outros a desejar. Um deles, uma árvore com raiz grande cercada juntamente com o lago foi arrancada e a sensação que o local é habitado pela quantidade de lixo no local. A água do lago tem cor de barro e os cágados dividem espaço com garrafas pets. Já os brinquedos, alguns estão em boas condições, outros oferecem perigos pelos pregos expostos. "A população está relaxada, porque quem coloca esse lixo aí?" questiona a pensionista Gilca da Silva Pereira, 76, que mora próximo à avenida e costuma fazer caminhada pela praça. Ela lamenta a falta dos patos e acha que o local precisa ser mais cuidado. "Do outro lado tem um valetão enorme e, quando a grama cresce oferece perigo para algum distraído", disse. Ela ficou sabendo, pelo Sanep, que é inviável a colocação de canos. Mesmo assim, acha que algo melhor pode ser feito no canal.
Praça da Balsa - Estrada do Engenho (Entre São Gonçalo e Porto)
O espaço recreativo, bastante frequentado por crianças, apresenta-se bem preservado. Um dos motivos são as várias placas pedindo para não jogar lixo. Mas a outra indicação - "oferendas aqui não" - não são cumpridas e uma das árvores estava rodeada de pratos típicos de orixás. A falta de uma proteção entre a área verde e a margem do canal São Gonçalo chamou a atenção da reportagem, até porque a beira d'água está cheia de lixo.
Praça São Marcos - Balneário Santo Antônio (Laranjal)
Uma das praças mais antigas do Laranjal, a São Marcos proporciona um cenário de muita beleza nessa época do ano. A folhagem das árvores caídas sobre o verde por causa da estação proporciona cores típicas da estação, em tons alaranjados, situação em que nem vale a pena solicitar a varrição do local. A área verde está em boas condições, mas os bancos deixam a desejar. "Essa praça é muito frequentada à tardinha por jovens e famílias que são obrigados a ir embora por falta de iluminação pública", disse o autônomo Pedro Ramos, 40. Para ele, este é o único porém da praça.
Para preservar
O secretário de Serviços Urbanos, Fábio Suanes, explica que há duas equipes de manutenção de praças permanentes, com rotas cíclicas já definidas, que são responsáveis pelas praças e micro parques. O trabalho é compartilhado com as equipes das regionais correspondentes. Se os moradores flagrar o depósito de lixo irregular e depredação das áreas, as denúncias podem ser feitas pelo telefone (53) 9917-55853.
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